Introdução
As Nações Unidas e a OMS definiram as doenças crônicas como uma ameaça global e incluíram entre as doenças maiores, além do câncer, as doenças cardiovasculares, o diabetes e também as doenças respiratórias crônicas, principalmente a DPOC.
A importância da DPOC foi assinalada acima. O diagnóstico de DPOC se baseia em uma combinação de achados clínicos e realização do teste de função pulmonar (espirometria), que mostra dificuldade persistente da saída do ar dos pulmões por obstrução ao fluxo de ar (daí o nome doença pulmonar obstrutiva crônica).
Não existe um teste diagnóstico único para a DPOC, já que tosse crônica, falta de ar e obstrução à saída do ar dos pulmões podem ser encontradas em outras doenças que cursam com obstrução ao fluxo de ar.
A DPOC é subdiagnosticada no mundo todo, incluindo países desenvolvidos e em desenvolvimento, alcançando em alguns estudos 90% dos casos. Mais surpreendente ainda é constatar que mesmo casos graves são diagnosticados em apenas metade dos casos. Os pacientes frequentemente atribuem a falta de ar ao envelhecimento e a tosse crônica a um “pigarro que todo fumante tem”.
Apenas a cessação do tabagismo (à parte o uso de O2 quando a doença é avançada) pode alterar o curso natural da doença e melhorar a sobrevida naqueles afetados. Entretanto, o diagnóstico em fase mais precoce acompanhado da cessação do tabagismo, resulta em desaceleração da perda da função pulmonar com menor chance de incapacidade no futuro.
Existe um consenso de que o diagnóstico de DPOC deve ser buscado nos grupos de risco ao invés da população como um todo. O custo para avaliar toda a população seria demasiadamente elevado. Já a chance de diagnóstico é muito maior se os fumantes com mais de 40 anos são avaliados, especialmente na presença de sintomas respiratórios. Esta estratégia requer, entretanto, que os clínicos que são os médicos que atendem a grande maioria da população, tenham um alto índice de suspeita nestes casos, e solicitem prova de função pulmonar para confirmação diagnóstica. Os pacientes muitas vezes consultam os médicos em episódios de piora da doença devido a uma exacerbação. Com frequência nestes casos, os médicos subestimam a situação, diagnosticando o episódio simplesmente como um quadro agudo, e não uma expressão de uma condição subjacente crônica, de maior gravidade.
Questionários que podem ser preenchidos pelos pacientes de risco (fumantes com mais de 40 anos) devem ser mais amplamente utilizados.
Faça seu teste aqui.
O que é a doença pulmonar obstrutiva crônica?
A doença pulmonar obstrutiva crônica, também chamada de DPOC, é uma condição que inclui duas doenças principais: bronquite crônica e enfisema. A intensidade de cada componente em um determinado paciente (bronquite crônica e enfisema) é variável. A palavra obstrutiva significa que ao se fazer um teste de função pulmonar, na DPOC, os pulmões se esvaziam mais lentamente em comparação a pessoas de mesmo sexo, idade e estatura.
Na bronquite crônica existe uma inflamação crônica dos brônquios e bronquíolos.
No enfisema os alvéolos são literalmente dissolvidos, formando-se “buracos“ nos pulmões, com perda da área disponível para a troca gasosa.
A obstrução à passagem do ar na DPOC se deve à redução do calibre dos brônquios e bronquíolos e ao enfisema. No enfisema, os pulmões perdem a elasticidade, e como um balão grande, mas murcho, levam ao esvaziamento mais lento dos pulmões.
Diagnóstico
Além da história, do exame clínico e da radiografia de tórax, é feito um teste de função pulmonar, que é o que confirma o diagnóstico.
Embora os sintomas e o exame clínico possam sugerir a presença de DPOC, o teste que confirma o diagnóstico é a espirometria.
Neste exame o paciente, após encher os pulmões, sopra com toda a força em uma máquina, que irá mostrar a dificuldade de esvaziamento dos pulmões. Os indivíduos fumantes ou ex-fumantes, com 40 anos ou mais, com ou sem tosse crônica e falta de ar, devem realizar o teste de função pulmonar, que irá detectar a doença em fase precoce, fase em que o tratamento é mais eficaz.
Tratamento
Parar de fumar é o tratamento mais importante. Nenhum outro tratamento é necessário se a doença está em um estágio inicial e os sintomas são leves. Nenhum tratamento cura a DPOC. O objetivo do tratamento é aliviar os sintomas. Alguns tratamentos podem reduzir o número de crises (exacerbações). A resposta a determinado tratamento na DPOC pode ser maior ou menor, ou mesmo não ter nenhum efeito. Como regra geral, um determinado tratamento feito por 1-3 meses irá dar uma ideia se está ajudando ou não. Um tratamento pode ser continuado se o uso mostrou que a medicação ajuda, mas pode ser cessado e trocado se não tiver efeito.
O tratamento da DPOC pode ser separado em três tópicos:
Tratamento da DPOC estável
Medicações broncodilatadoras (que relaxam e abrem os brônquios, facilitando a passagem de ar) são essenciais para o tratamento da DPOC. Eles podem ser inalados como aerossóis através de bombinhas ou aparelhos de inalação, em forma de pós para inalação, ou usados em comprimidos. O uso por via inalatória é preferível, porque o medicamento é liberado em pequenas doses, diretamente para os brônquios. Os medicamentos dados por inalação ou aspiração são seguros, exceto para os portadores de doenças cardíacas associadas. Um nebulizador transforma um medicamento líquido em um vapor (como uma névoa) que você pode respirar. Esta máquina é frequentemente usada para tratar pessoas com DPOC mais grave. O nebulizador também pode ajudar pessoas que tem dificuldade para usar as bombinhas, mas o uso de uma bombinha através de um espaçador faz o mesmo efeito ou até funciona melhor (veja a seção de asma).
Broncodilatadores por inalação de curta-duração
Estes broncodilatadores são em geral usados em forma de bombinha. Eles atuam relaxando rapidamente os músculos que envolvem os brônquios para dilatá-los o máximo possível. São medicamentos de alívio. Eles incluem:
Exemplos são o salbutamol (Aerolin) e o fenoterol (Berotec)
Por exemplo, ipratrópio.
Estes dois tipos de broncodilatador podem ser associados no mesmo dispositivo (Duovent, por exemplo).
Estes inaladores funcionam bem para algumas pessoas, mas não para outras. Tipicamente, os sintomas de falta de ar e chiado melhoram dentro de 5-15 minutos com um beta-agonista inalado, e dentro de 30-40 minutos com o ipratrópio. O efeito de ambos tipicamente dura 3-6 horas. Algumas pessoas com sintomas leves ou intermitentes precisam usar estes broncodilatadores quando apresentam chiado ou falta de ar. Podem também ser recomendados antes da realização de esforços que resultam em falta de ar.
Se o paciente tem sintomas frequentes ou contínuos, é preferível fazer uso de um broncodilatador beta-agonista ou anticolinérgico, mas de longa duração.
Funcionam de maneira semelhante aos de curta-duração, mas o efeito de cada dose dura de 12 a 24 horas.
Beta-agonistas inalados. Exemplos são: formoterol (Foradil), salmeterol (Serevent), indacaterol (Onbrize) e olodaterol (Striverdi).
Anticolinérgicos inalados. Exemplos são o tiotropio (Spiriva) e o glicopirronio (Seebri)
Além destes medicamentos, você pode continuar o uso do seu broncodilatador de curta-duração para rápido alívio dos sintomas.
Um corticóide inalado pode ajudar em adição ao broncodilatador inalado se você tem DPOC grave ou exacerbações frequentes. Os corticoides reduzem a inflamação. Os corticoides inalados na DPOC são sempre usados em combinação com um broncodilatador de longa duração. Isto pode ser feito pelo uso de dois dispositivos de inalação, ou, mais facilmente usando-se um dispositivo que já traz combinados os dois medicamentos. Os principais corticoides inalados são:
O corticóide inalado não tem efeito imediato sobre os sintomas da DPOC, mas pode ajudar a prevenir as crises. Efeitos colaterais dos corticoides inalados incluem monilíase oral (“sapinho na boca”), dor de garganta e voz rouca. Estes efeitos podem ser reduzidos pela lavagem bucal após o uso.
São exemplos de inaladores que combinam um corticoide e um broncodilatador de longa duração:
A teofilina (Talofilina, Teolong) é um broncodilatador oral prescrito ocasionalmente. A bamifilina é um medicamento semelhante à teofilina (Bamifix).
A aminofilina é um medicamento também semelhante à teofilina, antigamente usado por injeção na veia, dada lentamente no hospital, em casos de crises e asma e DPOC. Existe em comprimidos, mas precisa ser tomado 4 vezes ao dia. Está atualmente abandonada, por seu efeito fraco.
O roflumilaste (Daxas) é um medicamento dado por via oral, que tem uma atividade anti-inflamatória, além de um pequeno efeito broncodilatador. Não é um corticoide. É indicado em casos de DPOC grave, com produção crônica de escarro (bronquite crônica), com exacerbações frequentes, apesar do uso de outros medicamentos. Os efeitos colaterais são frequentes.
Medicamentos mucolíticos– Um medicamento mucolítico, tal como a acetilcisteína, torna o catarro menos espesso e pegajoso, e mais fácil de expectorar. Isto pode dificultar a colonização dos brônquios por bactérias e reduzir as infecções dos brônquios.
Tratamento das exacerbações
O tratamento de uma crise (exacerbação) de DPOC envolve o uso de outras medicações além daquelas que você faz uso habitualmente. Em geral são prescritos corticoides por comprimidos e muitas vezes antibióticos.
Nos últimos anos se demonstrou que o uso prolongado de um antibiótico denominado azitromicina, é capaz de reduzir o número de exacerbações. Este antibiótico tem outros efeitos, além de antibacteriano, e pode ser prescrito se você tem três ou mais exacerbações por ano. Um eletrocardiograma e uma audiometria devem ser feitos antes de deu uso.
Em casos de exacerbação o uso do broncodilatador de alívio deve ser frequente em intervalos menores (cada 4-6 horas) e em doses maiores (até 4 jatos por vez). O corticoide por comprimido, em geral prednisona ou prednisolona, 40 mg, é usualmente prescrito por 5 dias (estudo recente comprovou que mais tempo em geral não é necessário). O uso de cursos curtos de corticoide em comprimidos até quatro vezes por ano não produz os efeitos colaterais temidos desta medicação, como ganho de peso e osteoporose.
Na DPOC, o uso crônico de comprimidos de corticoide deve ser evitado, embora em raros pacientes seja a única alternativa para controlar a doença.
Um curso curto de antibióticos é frequentemente prescrito em exacerbações, quando e escarro mostra que há pus, o que em geral indica infecção bacteriana.
Se os seus sintomas são muito acentuados, ou se o tratamento para a exacerbação não está funcionando bem, você pode precisar ser internado. No hospital você pode ser seguido mais de perto.
Tratamento da DPOC grave
Os broncodilatadores de longa duração são frequentemente usados neste grupo de pacientes, mas um broncodilatador de curta duração deve ser sempre disponível para alívio imediato. Muitos pacientes preferem o salbutamol em comparação ao ipratrópio devido ao seu mais rápido inicio de ação. Atualmente existem broncodilatadores de longa duração beta-agonistas e anti-colinérgicos com duração de efeito de 12 a 24 horas. Todos eles resultam no alívio da falta de ar, mas as respostas muitas vezes são individuais. Além disto, estes broncodilatadores reduzem em 15 a 20% a frequência de exacerbações.
Efeitos colaterais associados a broncodilatadores de longa duração são geralmente pequenos.
Os corticosteroides inalados são também largamente prescritos para pacientes com DPOC grave. Semelhante aos broncodilatadores de longa duração, os corticosteroides inalados reduzem a frequência de exacerbações em 15 a 20% e também melhoram os sintomas, embora apenas modestamente. A combinação de um corticoide inalado com um broncodilatador de longa duração é capaz de reduzir ainda mais a taxa de exacerbações (em torno de 10% a mais). Disfonia e monilíase de garganta são os efeitos adversos mais comuns. Os corticoides inalados embora reduzam as infecções brônquicas em DPOC, paradoxalmente podem aumentar risco de pneumonia, embora sem aumento da mortalidade. Na DPOC em fase avançada outros tratamentos além de medicamentos são frequentemente necessários. Os mais importantes são a seguir comentados:
Oxigênio domiciliar
O uso de oxigênio (oxigenoterapia) irá ajudar muitos pacientes com DPOC avançada.
Em alguns pacientes com DPOC avançada, o uso de oxigênio pode aumentar o gás carbônico no sangue. Nestes casos (e só nestes casos) o oxigênio em excesso pode ser perigoso.
Comprovadamente o oxigênio prolonga a vida de quem dele precisa, e não vicia desde que todas as células de nosso organismo necessitam de oxigênio para o funcionamento adequado.
Exercícios físicos
Diversos estudos têm demonstrado que as pessoas com DPOC que se exercitam regularmente podem ter melhora da falta de ar, e melhor qualidade de vida. Qualquer exercício com atividade física regular é bom. Contudo, idealmente, a atividade que você deveria fazer deve te deixar um pouco cansado, durar pelo menos 20 a 30 minutos, e ser realizada 4 a 5 vezes por semana.
Dieta
Alguns pacientes com DPOC apresenta desnutrição sendo muito magros. Outros estão acima do peso ou são obesos. Estas duas situações devem ser tratadas. Um nutricionista pode ajudar.
Vacinas
Vacinas para pneumonia e gripe devem ser dadas para todos os pacientes com DPOC. Para detalhes ver texto acima.
Reabilitação pulmonar
Quando a falta de ar prejudica as atividades, está indicado um programa de reabilitação pulmonar. Diversos centros contam com um grupo de profissionais que irão orientar um programa dirigido para educação sobre a doença e uso de medicamentos, exercícios para melhora da capacidade física e orientações sobre o estado psicológico e melhor interação social. Depressão, ansiedade e isolamento são comuns em portadores de DPOC.
Cirurgias para DPOC
O transplante pulmonar é uma opção para quem tem enfisema grave. Em casos especiais, uma cirurgia que pode melhorar a falta de envolve a retirada das partes mais doentes com enfisema, com a finalidade de facilitar a respiração da parte do pulmão não doente (cirurgia redutora de volume). Este procedimento pode ser feito em certos centros através de broncoscopia, com colocação de válvulas dentro dos brônquios das regiões mais afetadas. Pacientes que tem grandes bolhas de enfisema com o restante dos pulmões pouco comprometido, e com falta de ar podem se beneficiar da retirada das bolhas.
Reposição de alfa-1-antitripsina
Alguns pacientes têm deficiência de uma enzima, que protege contra o desenvolvimento do enfisema (alfa-1 antitripsina). Pode ser feita reposição, mas o medicamento é de custo muito elevado e precisa ser dado por via intravenosa semanalmente. Nem todos os portadores desta deficiência precisam receber esta medicação.